Dentre
os aspectos que caracterizam a religião, destaca-se aquele acento
fenomenológico que se debruça sobre um conjunto de manifestações. Há sempre um
grito ouvido e uma mão estendida para o auxílio. O grito de uma injustiça. O
pranto da viúva, do estrangeiro e o abandono do órfão. O grito de um homicídio
e de um fratricídio. É o grito da razão em busca de compreensão.
Nas
páginas da Escritura, encontra-se uma progressiva manifestação divina que
intervém em favor da humanidade aflita e abandonada. No livro do Êxodo (3,7-9),
lê-se: “Estou vendo muito bem a aflição
do meu povo que está no Egito. Ouvi seu clamor diante de seus opressores [...].
Desci para libertá-lo do poder dos egípcios [...]. O clamor dos filhos de
Israel chegou até mim”. A religião bíblica com seu apelo em prol do comum
exerce papel determinante no combate aos variados tipos de opressão social.
No
diálogo com a humanidade representada por Caim no livro do Gênesis (4,10), Deus
dirige a seguinte pergunta: “O que foi
que você fez? O clamor do sangue do seu irmão grita por mim [...]”. A
religião bíblica assume um compromisso inalienável com a vida em toda extensão
do seu devir.
No
decorrer das suas inúmeras intervenções, Deus esclarece os detalhes do seu
compromisso, da sua aliança. Lê-se no livro de Zacarias (7,10): “Não oprimam a viúva e o órfão, o
estrangeiro e o pobre; e ninguém fique, em seu coração, tramando o mal contra
seu irmão”. A religião bíblica leva ao combate das situações que mais
impedem o desenvolvimento das capacidades e aptidões humanas.
Dos
extratos bíblicos acentuados, emerge um preciso perfil da religião que acalenta
a razão na honrosa tarefa de conhecer e elucidar a sua identidade. A religião
implica uma pedagogia da libertação. No caminho da religião conhecemos quem
liberta, como, quando e para que liberta. O percurso proposto pela religião
deve levar ao compromisso de libertar, deve mostrar que somos livres para
libertar.
Na
sua identidade intelectiva, a religião é leitura de uma fenomenologia da
existência à luz da fragilidade experimentada ao longo da trajetória comum da
humanidade. E nesta leitura fenomenológica, a religião se reveste de um caráter
inclusivo. Este é sem dúvida um grande contributo da religião para a sociedade,
particularmente quando tende ao culto da exclusão e da supressão do diferente.
Assim
sendo, a leitura da religião se manifesta qual experiência social marcada por
um pluralismo que acolhe e integra num itinerário de compreensão de Deus, do
outro e de si. A pedagogia da encarnação presente no cristianismo e em outras
religiões enfatiza a construção de uma visão integral do fenômeno humano a
partir da sua real fragilidade e do seu desejo natural de liberdade.
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