A analogia foi um dos instrumentos utilizados por Platão para
expor filosofia. A palavra analogia é formada por dois termos: “ana” e
“logos”. O primeiro significa “para o
alto”, o segundo, “discurso”. Toda analogia implica um discurso para o alto.
São tomadas em consideração imagens e situações do cotidiano, com o intuito de
elucidar questões que as superam. O discurso filosófico parte de uma
constatação comum para ultrapassá-la. Esta superação do comum apresenta a
filosofia como movimento de interpretação. Em outros termos, a filosofia se
move numa metalinguagem. O seu discurso não se exaure no mero descritivo, mas
prevê a passagem rumo ao interpretativo.
A imagem da segunda navegação elucida quanto afirmo. Platão
utiliza uma imagem cara aos seus interlocutores e descreve este momento fácil e
tranquilo que consiste na primeira navegação. Esta facilidade provém do fato
que o navegador conta com a força dos ventos que sopram sobre as velas e levam
a embarcação para o mar. Nesta etapa da trajetória não há como tocar a eficácia
do navegador. Platão explica que esta impetuosidade dos ventos refere-se ao
momento da filosofia pré-socrática marcada pela busca de um princípio ordenador
do universo, uma causa primeira através da qual se esclareça o surgimento de
tudo aquilo que vemos, tocamos e experimentamos.
Na leitura dos pré-socráticos, esta causa explicativa do
universo residia nos elementos naturais, equivalia a uma realidade física
identificada com a água (Tales), com o ar (Anaxímenes), com o indeterminado (Anaximandro)
e com os átomos (Demócrito). A primeira abordagem filosófica desenvolveu-se nos
quadros da física. Somente com a chegada de Sócrates houve um deslocamento, a
filosofia debruçou-se sobre o universo humano e tornou-se antropológica.
Platão considera ainda a primeira navegação como o momento de
domínio da opinião. A opinião é ausência de fundamento. A ciência, reflexo da
filosofia, é presença de fundamento. Sob a hegemonia das opiniões que sopram
sobre as velas do pensar, o navegador não assume protagonismo algum nos
roteiros do conhecimento. Mais que conduzir, o condutor é conduzido, aceitando
que as rotas da travessia sejam definidas por saqueadores que usurpam a
autonomia do pensar.
Cessados os ventos o navegador encontra-se em alto mar, exposto
aos perigos característicos desta situação. Faz-se necessário uma decisão com a
qual se verá a desenvoltura do navegador que utilizará os remos para ajudar os
companheiros e salvar a própria pele. Mover os remos sugere um esforço físico
até então desconhecido. É preciso movimentar os braços de forma sincrônica e
traçar as rotas que levarão para onde se quer ir e não para onde os ventos
querem levar. Esta é a segunda navegação.
Na explicação de Platão o empenho físico cede lugar ao esforço
racional que é o claro sinônimo de toda proposta filosófica. A filosofia é
esforço crítico que delineia os percursos do conhecimento sem delegar a outros
rumos e metas, sem alienar o papel do sujeito nesta intransferível tarefa, sem
terceirizar o que mais caracteriza a trajetória humana: a capacidade de pensar.
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