quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Filosofia: Narração e Ética.

Afirmar que a filosofia nasce política traz consigo algumas consequências, diante das quais perguntaríamos: Quando a filosofia nasce, o que encontra na cidade? A filosofia se depara com uma cidade repleta de mitos. Se preferirmos, as narrações que a filosofia escuta na polis são privas de fundamento, muitas destas serviam para manter atrelado ao superficial, protelando o esforço racional necessário para a construção de posições fundamentadas. Em outras palavras, a filosofia assumiu a tarefa de interrogar o telos da narração ou ainda, a finalidade daquilo que é narrado.
A narração que a filosofia encontra visa blindar um ethos para que este não seja questionado e fortalecido por um sono tranquilo, percorra livremente o caminho das engenharias perversas que originam os projetos de opressão e dominação. Talvez estaríamos antropomorfizando a filosofia? Acredito que não. Aqui está a identidade específica da filosofia. O filósofo não é um lunático. Não se trata de alguém que pratica filosofia, trancafiado no próprio quarto. As lacunas e as conquistas de um tempo formam o objeto de estudo com o qual a filosofia trabalha.
Percorrendo as ruas da cidade, a filosofia desmistifica a atividade narrativa. A filosofia mostra que a narração pode perseguir finalidades, que não são mais aquelas que privilegiam os interesses de um indivíduo, de uma classe ou de um partido, mas sim aquelas que acentuam o bem comum social. Desta forma, diríamos que se de um lado a narração ideológica visa encobrir, a narração filosófica visa descobrir. Enquanto a narração ideológica quer mascarar, a narração filosófica quer desmascarar.
Esta circularidade entre narração e ethos foi desde cedo utilizada pela filosofia para alcançar as suas finalidades políticas. A filosofia é uma atividade apaixonada pela cidade. Em outros termos, a filosofia sempre quis prestar a cidade os seus melhores serviços, mesmo que não tenham sido aceitos na proporção esperada. Por vezes, a voz da ideologia parece mais forte, mais convincente e consegue facilmente seduzir a política, enfraquecendo-a e arrastando-a para fins que contrariam sua identidade.

A cidade é algo tão precioso que a filosofia diria que não podemos confiá-la a qualquer um. Para que a cidade concretize os seus ideais é preciso que seja conduzida por pessoas que foram preparadas para o bom desempenho desta função primordial para a saúde do corpo social. Em muitas circunstâncias, a filosofia permanece com este sabor amargo nos lábios, de ter muito idealizado e quem sabe, pouco realizado. A narração utilizada pela filosofia assume esta tarefa de tutela da cidade que é o palco cênico das realizações humanas. Narrações e comportamentos nascem na cidade que temos, mas também originam a cidade que queremos.

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