Com exceção do relato acerca
das tentações sofridas durante os longos dias no deserto, o Evangelho nunca nos
apresenta Jesus como um místico, como um homem que vive exclusivamente
absolvido pela contemplação de uma realidade transcendente. O Jesus do Evangelho
não é um padre no sentido estreito do termo, não está preocupado com a
prosperidade do feudo, como testemunham as páginas escritas e não escritas da
história. O Jesus do Evangelho não é um bispo que desvirtua a ação litúrgica do
seu teor celebrativo, reduzindo-a a um mero desfile de moda medieval.
Dirigindo-se aos bispos do
Conselho Episcopal latino-americano, reunidos na cidade do Rio de Janeiro (28
de julho de 2013), o Papa Francisco pediu aos bispos que não tenham uma
psicologia de príncipes, que dominam sobre os vassalos, mas ao contrário, sejam
amantes da pobreza, pastores pacientes e misericordiosos.
Facilmente nos comovemos
diante da pobreza, mas qual é o estilo de vida dos atuais seguidores de Jesus?
Ainda recordamos que o então cardeal Bergoglio percorria as ruas da capital
argentina utilizando o transporte público? Recordamos que o Papa Francisco
pediu aos padres e religiosos que usem carros modestos, que sirvam ao pastoreio
e não aos orgulhos da moda automobilística? Ainda hoje existem padres que nas
paróquias entendem que a primeira e fundamental ação pastoral consiste na
fatídica troca do carro. Certa vez, conversando com uma amiga advogada no
corredor de uma faculdade da capital sergipana, ouvi palavras que apenas a
sabedoria feminina seria capaz de expressá-las com tamanha beleza: “O Papa
Francisco fará com que os católicos sejam mais evangélicos”.
É preciso dizer outra coisa:
O Jesus do Evangelho não é um destes senhores que se autointitulam bispos e
pastores. Como se tornaram bispos fora da sucessão apostólica? Onde está a
historicidade tão exigida em outros âmbitos da reflexão acerca da religião?
Muitos destes senhores traíram a Boa Nova trazida por Jesus e transformaram a
religião num dos negócios mais rentáveis deste tempo.
Mesmo considerados pastores,
constatamos todos os dias e, sobretudo no período eleitoral, que apascentam
apenas a si mesmos. Nunca vimos tantos pastores dentre os vereadores do país.
Estes pastores exercem mandatos como deputados estaduais, federais, prefeitos, ocupam
o senado e até marcam presença nas falcatruas antipolíticas da nação. A quem
estão pastoreando? A quem estão apascentando? Estes pastores transformaram as
igrejas em verdadeiros currais eleitorais.
O Jesus do Evangelho não
aceita esta pseudoteologia da prosperidade que está sendo apregoada por aí
afora. Qual foi a exclamação de Zaqueu diante de Jesus? Jesus aumente dez vezes
os meus bens? Foi totalmente outra: Senhor,
eis que eu dou aos pobres metade dos meus bens; e, se nalguma coisa tenho
defraudado alguém, o restituo quadruplicado.
(Lucas
19,8) Parece uma postura diferente?
O Jesus do Evangelho é um
homem sensível e dedicado, capaz de suportar o peso do trabalho tendo José ao
seu lado. O Jesus do Evangelho é atento e mesmo circundado pela multidão
pergunta aos seus seguidores: “Quem é que
me tocou?” Jesus acolheu a todos, mas de modo especial acolheu esta mulher
enferma e explorada que gastou todos os seus bens em vão com os médicos da
época (Lucas 8, 43-48).
O Jesus do Evangelho ama a
todos, mas tem uma opção preferencial pelos fracos, os últimos, os humilhados,
pelos que foram privados de voz. E as religiões que o invocam serão autênticas
na medida em que assim o seguirem. As palavras do bispo dom Claudio Hummes
dirigidas ao então cardeal Bergoglio ressoam nas páginas recentes da Igreja
Católica: “Não se esqueça dos pobres”
(13 de março de 2013). Este homem tornou-se o amado Papa Francisco, que deseja
uma igreja pobre e para os pobres.
Nenhum comentário:
Postar um comentário