sexta-feira, 21 de novembro de 2014

O Jesus do Evangelho

Com exceção do relato acerca das tentações sofridas durante os longos dias no deserto, o Evangelho nunca nos apresenta Jesus como um místico, como um homem que vive exclusivamente absolvido pela contemplação de uma realidade transcendente. O Jesus do Evangelho não é um padre no sentido estreito do termo, não está preocupado com a prosperidade do feudo, como testemunham as páginas escritas e não escritas da história. O Jesus do Evangelho não é um bispo que desvirtua a ação litúrgica do seu teor celebrativo, reduzindo-a a um mero desfile de moda medieval.
Dirigindo-se aos bispos do Conselho Episcopal latino-americano, reunidos na cidade do Rio de Janeiro (28 de julho de 2013), o Papa Francisco pediu aos bispos que não tenham uma psicologia de príncipes, que dominam sobre os vassalos, mas ao contrário, sejam amantes da pobreza, pastores pacientes e misericordiosos.
Facilmente nos comovemos diante da pobreza, mas qual é o estilo de vida dos atuais seguidores de Jesus? Ainda recordamos que o então cardeal Bergoglio percorria as ruas da capital argentina utilizando o transporte público? Recordamos que o Papa Francisco pediu aos padres e religiosos que usem carros modestos, que sirvam ao pastoreio e não aos orgulhos da moda automobilística? Ainda hoje existem padres que nas paróquias entendem que a primeira e fundamental ação pastoral consiste na fatídica troca do carro. Certa vez, conversando com uma amiga advogada no corredor de uma faculdade da capital sergipana, ouvi palavras que apenas a sabedoria feminina seria capaz de expressá-las com tamanha beleza: “O Papa Francisco fará com que os católicos sejam mais evangélicos”.
É preciso dizer outra coisa: O Jesus do Evangelho não é um destes senhores que se autointitulam bispos e pastores. Como se tornaram bispos fora da sucessão apostólica? Onde está a historicidade tão exigida em outros âmbitos da reflexão acerca da religião? Muitos destes senhores traíram a Boa Nova trazida por Jesus e transformaram a religião num dos negócios mais rentáveis deste tempo.
Mesmo considerados pastores, constatamos todos os dias e, sobretudo no período eleitoral, que apascentam apenas a si mesmos. Nunca vimos tantos pastores dentre os vereadores do país. Estes pastores exercem mandatos como deputados estaduais, federais, prefeitos, ocupam o senado e até marcam presença nas falcatruas antipolíticas da nação. A quem estão pastoreando? A quem estão apascentando? Estes pastores transformaram as igrejas em verdadeiros currais eleitorais.
O Jesus do Evangelho não aceita esta pseudoteologia da prosperidade que está sendo apregoada por aí afora. Qual foi a exclamação de Zaqueu diante de Jesus? Jesus aumente dez vezes os meus bens? Foi totalmente outra: Senhor, eis que eu dou aos pobres metade dos meus bens; e, se nalguma coisa tenho defraudado alguém, o restituo quadruplicado. (Lucas 19,8) Parece uma postura diferente?
O Jesus do Evangelho é um homem sensível e dedicado, capaz de suportar o peso do trabalho tendo José ao seu lado. O Jesus do Evangelho é atento e mesmo circundado pela multidão pergunta aos seus seguidores: “Quem é que me tocou?” Jesus acolheu a todos, mas de modo especial acolheu esta mulher enferma e explorada que gastou todos os seus bens em vão com os médicos da época (Lucas 8, 43-48).
O Jesus do Evangelho ama a todos, mas tem uma opção preferencial pelos fracos, os últimos, os humilhados, pelos que foram privados de voz. E as religiões que o invocam serão autênticas na medida em que assim o seguirem. As palavras do bispo dom Claudio Hummes dirigidas ao então cardeal Bergoglio ressoam nas páginas recentes da Igreja Católica: “Não se esqueça dos pobres” (13 de março de 2013). Este homem tornou-se o amado Papa Francisco, que deseja uma igreja pobre e para os pobres.

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