Provocando os alunos numa dessas aulas sobre
as possíveis relações entre cultura e direito, fui surpreendido pela seguinte
intervenção: “Professor! Já nascemos velhos. Nascemos herdando uma cultura que
não criamos”. Entre elogios e incentivos, voltei pra casa com o propósito de
procurar o autor desta afirmação. Utilizando a tecnologia como ferramenta a
favor do conhecimento, não foi difícil descobrir a poesia elaborada por Carlos
Drummond de Andrade. Deixando de lado o poeta brasileiro, cabe-nos pensar onde
e quando, como e porque é inevitável que cedo ou tarde filosofia e direito
terminem se encontrando por aí.
Lendo alguns textos de Paulo Nader, no seu
manual “Filosofia do direito”,
encontramos o direito enquanto processo de adaptação social. Adaptar é sempre
algo perigoso, mas igualmente necessário. Adaptar é um dos verbos que melhor
traduz o fenômeno humano. Nós mesmos estamos sempre nos adaptando diante de
determinadas circunstâncias criadas pelas nossas mãos ou por aquelas dos
coetâneos.
Este processo de adaptação social que é o
direito deve atingir suas metas, seus próprios fins que remetem a insuperável
teleologia do direito. Os estudiosos deste processo de adaptação tão antigo
quanto novo, afirmam que a finalidade do direito consiste em atingir o
equilíbrio social, que é o legítimo sobrenome da justiça buscada pelo direito e
também pela filosofia.
Sabemos que não se busca aquilo que não se
conhece. Para que a busca de algo seja eficaz, é preciso saber as
características deste algo procurado.
Sendo assim, a filosofia procura dizer ao
direito o que é esta justiça que ele busca ou ao menos deve buscar. Não quero
apresentar uma definição tout court
acerca da justiça, nem analisar um quadro histórico com as evoluções e as possíveis
involuções desta definição. Mas de qualquer modo há sempre uma identidade que
deve ser vista em toda definição de justiça, a sua ausência implica a dura e
irrevogável pena de desvirtuá-la, torná-la qualquer coisa exceto aquilo que ela
é verdadeiramente.
Mesmo respeitando as peculiaridades dos
autores e as circunstâncias históricas que envolvem a definição de justiça,
esta jamais se eximirá da tarefa que consiste em “dar a cada um aquilo que é
seu”. Esta identidade fundamental da justiça parece vaga, mas quando nos
debruçamos sobre a mesma, percebemos que se trata de algo concreto, enraizado
no tecido socioeconômico da cidade. A justiça enquanto tarefa de “dar a cada um
aquilo que é seu” dinamiza o direito no seu ideal de encarar a cidade a partir
do seu necessário equilíbrio social. E recorda que o direito não pode ser
apenas um puro e simples produto cultural. O direito absolve as exigências e
apelos de uma cultura, mas está atento para criticá-la, para não mimá-la, não
torna-la má educada, viciada em reservar muito para poucos e bem pouco para
muitos.
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