Os
sentimentos, os anseios e as conquistas de um país, alcançadas graças ao
trabalho realizado por movimentos sociais, sindicatos, classes políticas e
empresariais, geram esta Carta macro política que é a Constituição. Nesta,
encontram-se direitos e deveres que regulam as multíplices relações entre o
Estado e o cidadão, garantindo o exigente protagonismo na elaboração de um
tecido político que não resulte de arbitrariedades escusas, mas de princípios
norteadores comuns. Desta forma, a Constituição exerce função pedagógica,
favorecendo a indispensável educação política que suscita o autêntico exercício
da cidadania.
No
quesito das atribuições reservadas ao exercício da Presidência da República, a
Constituição contempla a emissão de decretos que visem a “organização e o
funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa”
(Art. 84. VI, a). Concomitantemente, é dever da Presidência “enviar ao
Congresso Nacional [...] o projeto de lei de diretrizes orçamentárias” (Art.
84. XXIII). Aqui estão as raízes que nutririam um processo de impedimento
contra o Presidente neste país continental, com um passado colonialista,
escravocrata e ditatorial que lança sombras para inibir consagradas conquistas
contemporâneas.
A
eleição do Presidente da República traz consigo o vice-presidente outrora
escolhido. Ouvindo o partido e coligações, escolhe-se um nome útil que atraia
votos para a vitória nas eleições já no primeiro ou posteriormente no segundo
turno (Art. 77. § 1.º; 2.º). Dentre as promessas assumidas durante a posse, ambos
comprometem-se a sustentar a união do país (Art. 78). Dos artigos da
Constituição, emerge um perfil do vice-presidente dotado de prudência e
discrição. E ainda, conhecedor dos limites dos seus possíveis exercícios que se
dão somente quando convocados diretamente pelo Presidente eleito com maioria
dos votos no país. Estas e outras virtudes republicanas concretizaram-se
admiravelmente em nomes quais: Itamar Augusto Cautiero Franco (1990-1992),
Marco Antônio de Oliveira Maciel (1995-2003) e José Alencar Gomes da Silva
(2003-2011).
Diante
dos fatos vivenciados, a Constituição faz uma releitura de si, para analisar o
papel da vice-presidência. A esta não cabe exigir protagonismos que foram
supostamente negados, nem mesmo recompensas por mediações realizadas durante as
turbulências que caracterizam todo e qualquer governo. Quando não se é capaz de
percorrer as circunscrições das próprias funções, se abre espaço para perversas
degenerações instaladas sob as asas da legalidade. A carta exposta – no dia 07
de dezembro de 2015 –, pelo vice-presidente tudo causou, exceto a concretização
daquela união nacional prometida durante o ato de posse presidencial.
O
fato é que a Constituição não entendeu que é muito cômodo obter a
vice-presidência sem travar grandes lutas e ao invés de somar esforços nos
momentos críticos, declarar-se candidamente contrário ao governo graças ao qual
foi eleito. Se há na vice-presidência tanta força política porque não se lançar
numa candidatura própria? Mesmo com comprovada agudez de olhar, a Constituição
permite que o governo origine um anti-governo? Sem demoras, a Constituição trará
instrumentos para limitar a atuação da vice-presidência? Está em curso uma
verdadeira parlamentarização do claudicante presidencialismo brasileiro?
João Claudio da
Conceição.
Vivemos um momento de aparente anomia política!
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