O
convívio social não pode ser visto como o brinquedo sob os caprichos políticos
que disseminam inseguranças de toda sorte e inclusive esta chamada de jurídica.
O conjunto de princípios que animam a reflexão jurídica e o papel da pena na
sociedade, possuem a função de assegurar que o julgamento não resulte de
arbitrariedades, de jogos midiáticos e nem de supostas pressões populares. O
ato de julgar não é traduzido por sentenças privadas, não se trata da expressão
de uma vingança articulada numa sucessão de etapas. O julgamento na sociedade
civil segue o sentimento coletivo de justiça, numa dimensão humanista e
integrativa, respeitosa da dignidade do ser humano.
Um
destes princípios consiste na legalidade e afirma que um comportamento só pode
ser apontado como criminoso e, portanto passível de pena quando previsto na
forma da lei (NUCCI, 2008, p. 70). Quanto dito toca a anterioridade da lei (NUCCI,
2008, p. 71) que não é criada como resposta impensada e curvada diante do furor
social para desprezar garantias conquistadas. A lei precisa evitar
abstracionismos e ser o quanto precisa na exposição das suas intenções. A lei
deve ser taxativa e fugir de ambiguidades que repercutiriam na sua
aplicabilidade. Este princípio é chamado de taxatividade (NUCCI, 2008, p. 75).
A
precisão contida na lei leva ao quesito da individualização isto é, a pena deve
ser aplicada considerando o impacto social do crime e a personalidade do autor.
Deste modo, a pena não é branda nem excessiva, mas na justa medida necessária
para gerar os aguardados equilíbrios sociais (NUCCI, 2008, p. 72). Entre o
crime cometido e a pena imputada há um equilíbrio que é pensado pelo princípio
da proporcionalidade (NUCCI, 2008, p. 75). A pena diz respeito apenas ao seu
autor e este deve cumpri-la nos termos da lei sem possibilidade de abranger
qualquer pessoa que não tenha participado do crime. O princípio da
personalidade auxilia nesta função de circunscrição da pena (NUCCI, 2008, p.
71).
Uma
vez codificada, a lei obedece a vigência e não exerce qualquer efeito diante de
condutas anteriores ao seu surgimento, salvo quando implicar um correto
favorecimento do réu (CAPEZ, 2009, p. 48). Assim esboçado o princípio da
irretroatividade da lei, vê-se ainda o princípio da adequação social, segundo o
qual a atividade jurídica não pode criminalizar um costume já absorvido pela
inteira sociedade (GRECO, 2007, p. 58). As questões acerca do jogo do bicho e da
descriminalização da maconha podem ser inseridas neste espaço e mesmo diante de
várias posições não receberam respostas definidas oriundas da comunidade
jurídica. A popularidade do jogo do bicho, as reconhecidas propriedades
medicinais e o suposto enfraquecimento econômico do tráfico seriam suficientes
para legitimar a descriminalização?
Ao
lado dos princípios elencados estão os princípios da intervenção mínima (NUCCI,
2008, p. 73) e da insignificância (GRECO, 2007, p. 69), que não são menos
intrigantes no convívio contemporâneo. O desenvolvimento jurídico trouxe consigo
um aprimoramento litigioso em detrimento de possíveis vias de conciliação.
Sendo assim, o direito penal que deve ser o último convocado para dirimir
tensões surgidas no convívio social, é chamado com frequência para discutir
questões que poderiam ser vistas sob a ótica do direito civil. Por motivos
desta ordem, o Brasil possui uma das maiores populações carcerárias do mundo,
trancafiadas em lugares que são palco de atrocidades que ferem o princípio da
humanidade, segundo o qual a pena não deve ser perpetuada, forçosa, segregar
através das expressões de crueldade e nem retirar a vida (NUCCI, 2008, p. 72).
Deste modo a atribuição da pena na sociedade brasileira fere em larga escala os
equilíbrios esperados no convívio social, já que deixa de ser mínima, imparcial
e humana, tornando-se máxima, discriminatória e desumana.
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