quarta-feira, 9 de março de 2016

Filosofia: O que é e onde está a Justiça?

Certa vez com alguns alunos, assistimos um documentário que trazia um episódio que marcou a região norte do país. Em 2006, no município de Óbidos, Estado do Pará, o adolescente Fabio Gualberto Pereira, de 16 anos, assassinou um membro de uma distinta família paraense. Por outros delitos cometidos, Fabio era visto como um problema naquela sociedade. Um Estado descumpridor dos deveres criou o problema Fábio. A questão é: Como solucioná-lo ou como eliminá-lo? Oito membros desta família capturaram o adolescente e o dilaceraram com tiros e facadas. O júri foi composto exclusivamente por pessoas do local que tinham suas vidas ligadas aos familiares, considerando o poderio econômico e sociopolítico que detinham. A decisão judicial absolveu os oito réus. Eis a questão: A decisão judicial foi justa? A justiça é só esta que é emitida pelos juízes ou também há algo além desta?
Vejamos o impacto da questão numa outra problematização: Em 2014, foi concedido aos juízes federais que não possuem residência nas localidades de trabalho, um auxílio moradia de quatro mil reais. No dia 08 de março de 2016, enquanto comemorávamos o dia internacional da mulher, a magistratura sergipana decidiu que as famílias abrigadas na Ponta da Asa, no bairro Santa Maria, não receberão auxílio moradia. Se colocássemos as questões nas mãos dos clássicos, diríamos: Qual das decisões provocou maior harmonia entre as classes sociais? Qual das decisões suscitou maiores equilíbrios sociais?
Houve sempre uma preocupação da parte dos filósofos clássicos para que a justiça não permanecesse circunscrita à decisão judicial. Jusnaturalistas e positivistas giram em torno desta problematização: A justiça possui uma identidade própria? É a justiça que se aproxima daqueles que a buscam? A justiça é apenas um produto cultural? A justiça se movimenta apenas numa esfera convencional? Os filósofos clássicos quiseram evitar que se equiparasse justiça e arbitrariedade. No diálogo “As Leis”, Platão aponta a função social das leis: proteger contra as manobras dos interesses pessoais. No capítulo V da Ética a Nicômaco, Aristóteles sinaliza a função social dos juízes: proteger a justiça fazendo com que gere equidade (cf. EN V, 6-7).
Na jusfilosofia medieval, Tomás de Aquino dedica um espaço aos juízes, apontados por Aristóteles como uma personificação da justiça. Cabe a eles a decisão acerca da justiça, mas não são sinônimos desta última. Os clamores populares não são a bússola dos juízes, mas sim a Constituição. Quando os responsáveis pela aplicação da justiça se pautam pelos clamores populares, é necessário averiguar se são assim tão populares e preparar-se, pois mudam com o vento. E sendo os juízes suscetíveis como os demais mortais, Tomás de Aquino os identificou como servidores das leis e não como proprietários que delas se utilizam guiados pelo bel prazer ou pelos jogos midiáticos que apresentaram o golpe de 64 com o belo eufemismo de política de Estado. Quais os valores transmitidos pelos meios de comunicação social? Eles fazem enxergar melhor ou criam miragens que distanciam a visão do todo?
No Brasil do regime ditatorial tivemos inúmeras conduções coercitivas de homens e mulheres que jamais retornaram aos seus lares. Qual era o tipo de quadro social? A filosofia, retirada agressivamente das salas de aula, teve que aguardar até o ano de 2006 para encontrar e dialogar com os jovens brasileiros. Os estudiosos e artistas que contrariaram o regime, convidados a deixar o país. Os trabalhos desencadeados pela Comissão Nacional da Verdade evidenciam que não se tratava de um país melhor (cf. Lei nº 12.528/2011). Estávamos diante de um Brasil amordaçado e torturado nos porões da impunidade. O Brasil contemporâneo vive um regime midiático? Interesses econômicos e partidários parcializam a atividade jurídica? Os canais televisivos e as revistas de circulação nacional determinam o que é, quando e por onde deve passar a justiça?

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