quinta-feira, 3 de setembro de 2015

A Magna Carta de 1215: a lei ao serviço da liberdade.

Dentre as características da sociedade contemporânea, certamente a liberdade está entre aquelas que se apresenta por si mesma. São inúmeros os esforços que a explicitam como também aqueles que visam protegê-la quando se vislumbram circunstâncias que ameaçam a integridade e a multiplicidade das suas expressões. A centralidade da liberdade na sociedade hodierna é tão indiscutível que graças a tantos esforços realizados, nos damos o luxo de discussões acerca do seu correto uso. Olhando para a história, constatamos que nem sempre foi assim. Até pouco tempo a liberdade foi mesmo um artigo raro usufruído por poucos privilegiados.
É nas densas páginas da erroneamente chamada idade das trevas, que se encontra pela primeira vez um documento jurídico centrado sobre a defesa da liberdade. Não há algo errado nesta posição? Há relação entre Medievo e Liberdade? Quando corretamente apresentado, livre de correntes ideológicas, constata-se que Primeiro Iluminismo (ou Iluminismo cristão), é o termo mais apropriado para este período da humanidade. O próprio Tomás de Aquino (1225), grande expoente da literatura filosófico-cristã, nasce numa Europa consciente do papel que a liberdade desempenha na sociedade. Esta é a indiscutível peculiaridade deste valioso tesouro jurídico apropriadamente chamado, Magna Carta (1215): apresentar solenemente, de modo claro e explícito que liberdade é o nome próprio da sociedade humana.
Olhando para as páginas políticas da história, percebe-se que a relação entre governo e governados foi marcada por constantes abusos. O primeiro, dotado de uma liberdade ilimitada, sempre impôs fardos absurdos ao exercício de liberdade dos seus governados. Bens preciosos, como: a propriedade, o trabalho, a locomoção, a expressão de opiniões e até mesmo a vida humana, ocuparam um lugar secundário, foram aniquilados quando não serviram aos interesses dos governantes que macularam o fenômeno humano com as agressões das tiranias e dos despotismos, dos totalitarismos e das ditaduras. São inúmeras as situações nas quais o governante se coloca acima da lei, instrumentalizando-a, direcionando-a a fins próprios em detrimento do benefício da coletividade. Na história humana, a lei exerceu o papel de dominação social que subjugava os governados e blindava o governante, isentando-o de responsabilidades e legitimando cruentas barbáries.
De uma forma ou de outra, todos um dia perguntamos acerca da especificidade de direitos que são ulteriormente adjetivados com o termo “humanos”. As respostas recolhidas na diversidade de autores e doutrinas irão nesta direção: trata-se de direitos inalienáveis, inerentes a pessoa humana enquanto tal, são indiscutíveis, não há nada que seja digno ao ponto de nutrir o propósito de trocá-los. Como todo universo humano, estes seguiram evoluções que originaram as gerações dos direitos fundamentais. A primeira geração destes direitos dedica-se inteiramente ao tema da defesa da liberdade e afunda as suas raízes na célebre declaração da Magna Carta.

O texto jurídico escrito no séc. XIII pelo rei João acentua a necessidade de limitação dos poderes exercidos pelo governante, apresenta a lei não como um escudo que protege arbitrariedades, mas sim como um instrumento ao serviço da liberdade. Na primeira cláusula da Magna Carta reside quanto será especificado no decorrer deste texto que é um verdadeiro hino a liberdade. Suas cláusulas ressoam pelas épocas sucessivas, intrigam as reflexões jurídicas hodiernas e exigem respostas dos operadores deste interminável processo de adaptação social que é o direito. Lê-se com espanto, admiração e expectativa: “1. Garantimos, também, a todos os homens [...] de nosso reino, de nossa parte e de parte de nossos herdeiros para sempre, todas as liberdades abaixo indicadas, para que eles e seus herdeiros as possuam”.

Um comentário: