domingo, 9 de agosto de 2015

Filosofia, Direito e Justiça

Conversando com os alunos costumo dizer que existem importantes pontos de encontro entre filosofia e direito. Se este último é tido como um conjunto de normas, consideramos a filosofia como um conjunto de questionamentos. Normas e questionamentos? Sim, não há ou ao menos não deveria haver qualquer separação entre estes dois pilares da sociedade.
Nestas conversas, tenho afirmado que a filosofia nasce política. Acredito necessária esta simples colocação, pois em muitos segmentos a filosofia é vista como uma peça depreciativa e priva de qualquer utilidade. Estamos sempre atrás de coisas úteis. Facilmente encontramos a utilidade da medicina, da enfermagem, daqueles saberes que cuidam da saúde, que é direito fundamental dos membros de uma sociedade.
Temos uma percepção clara da utilidade da multiplicidade das engenharias que vão desde a boa elaboração e execução das obras que embelezam a polis, ao cuidado e preservação do meio ambiente, para que o progresso da civilização não exerça um impacto negativo sobre esta Casa comum.
E a utilidade da filosofia? Além de nascer política, estabelecendo uma parceria vital com a cidade, a filosofia assume um compromisso com a justiça, o que continua aproximando-a de finalidades muito caras ao direito. O que estou dizendo? É isto mesmo: filosofia e justiça há muito se conhecem. A ausência de justiça questiona a filosofia e esta indaga aquilo que torna a justiça um artigo raro, tão luxuoso ao ponto de ser privilégio de poucos. Veloz para quem pode pagar e lenta para aqueles que só podem esperar.
Sabemos que desde as célebres páginas de Aristóteles, a filosofia esboça concepções de justiça enxergando-a na perspectiva do dar a cada um aquilo que lhe é próprio. É a partir desta leitura que a filosofia interroga a cidade para avaliar o seu teor de justiça. A filosofia sopra sobre nós a seguinte pergunta: Esta cidade é justa? A cidade é justa quando oferece aos seus membros aqueles instrumentos indispensáveis para o seu desenvolvimento.
Afirmar que a filosofia está comprometida com o aprimoramento da cidade através da realização da justiça é em definitiva expor a sua indiscutível tarefa de tutelar a pessoa humana. Esta é uma finalidade compartilhada com o direito. E desta finalidade que é comum, ouviríamos: Tais instrumentos são concedidos igualmente a todos? A cidade coloca todos os seus membros numa mesma linha de partida? Existem pessoas que começam bem além da linha de partida? Algumas sequer precisam correr, pois o enriquecimento injusto derivado do dinheiro desviado corre por elas? Outras até que desejariam, mas realmente não podem correr? Os seus direitos fundamentais foram negados? Sem saúde, educação, moradia e tantos outros elementos indispensáveis elencados no maravilhoso e irrealizável artigo 5º da Constituição Federal, milhares de pessoas não correm atrás dos sonhos, das metas e de si mesmas, neste Brasil que desde cedo legitima desigualdades.
Não sei qual o nome mais apropriado para a Constituição deste país. Por vezes, parece uma fábrica de ilusões, de miragens sociais que dissolvem no encontro com as discrepâncias de uma realidade agressora. É difícil aceitar que a Carta Maior do Brasil se reconheça como cidadã. Não é fácil reconhecê-la como expressão do sorriso cuidadoso de uma Pátria que deseja ser Mãe gentil.

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