Uma
das características centrais destes dias consiste na conquista de direitos e
garantias. Mas reconhecer direitos nem sempre foi algo assim tão natural como
se pode pensar. Muitas páginas da história da humanidade mostram a sistemática
usurpação de direitos que no solo brasileiro dizimou a fauna, a flora, o índio,
o negro, a mulher em nome de uma corte europeia que aqui se instalou trazendo
benefícios e mazelas de um progresso. Uma correta abordagem acerca dos direitos
humanos trará consigo o grito da alteridade, um apelo para que o direito
ultrapasse as barreiras de um clientelismo que isola e vá ao encontro do outro
que permanece fora, sem usufruir o que é construído nesta história. (PIOVESAN, 2014,
p. 75)
Este
é um risco comum quando se aborda hoje acerca dos direitos humanos: pensar que
tudo está pronto, reconhecido e consolidado, que já não é mais necessário
reivindicar. Há uma forte sensação que faz repensar o Brasil como um país
redescoberto em 1988. Após décadas de um silêncio ameaçador imposto pela
violência incontestável do regime militar que transformou este solo brasileiro
num cemitério clandestino e desesperador. A redemocratização não foi uma
varinha mágica que realizou os sonhos acalentados. Ainda existem vozes mais
ouvidas que sufocam as minorias e as maiorias desprezadas. Eis a identidade do
debate e da práxis que se instauram em torno dos direitos humanos. (PIOVESAN, 2014,
p. 76)
É
na obra de Flávia Piovesan, intitulada “Direitos humanos e o direito
constitucional internacional”, que se vê o amplo respiro que a reflexão
jurídica traz consigo. Assim a tarefa jurídica consiste em gerar redes de uma
hospitalidade efetiva, capaz de abrigar os inúmeros desalojados destes dias, que
ainda são impedidos de exercer a cidadania ativa. Deste modo, aproxima-se do
alicerce da construção jurídica, formado pela refutação da banalização da
arbitrariedade e pelo esforço em tornar o direito uma linguagem comum. É
preciso mostrar que não é normal lesar. Não há nada de humano nos atos de banir
e exterminar. Pelo contrário, estes e seus derivados, são atos desumanos e
reprováveis. (PIOVESAN, 2014, p. 77)
Há
uma difusa forma de pensar que minimiza de tal modo o tema dos direitos humanos
ao ponto de apresentá-los como os verdadeiros vilões da sociedade
contemporânea, que deve livrar-se destes postulados nocivos, responsabilizados
pelas sensações de injustiça. Parece que quando se recorre ao campo jurídico
cível, administrativo, tributário e ainda outros, não se toca, o conjunto
global e irredutível dos direitos humanos. Ao contrário daquilo que se escuta,
os direitos humanos não são o afago dos bandidos. Os direitos humanos
levantam-se em defesa do meio ambiente, da educação, da saúde e de outros
valores constitucionais. Talvez se enfatizou pouco, que todos os direitos são
humanos. (PIOVESAN, 2014, p. 80)
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